Advogados tributários e trabalhistas recomendam às empresas guardarem comprovantes de pagamentos de cursos e bolsas concedidas a funcionários para comprovar que o benefício não tem natureza salarial.
Isso porque há casos em que o empregado, ao se desligar da empresa, reivindica na Justiça o pagamento de verbas trabalhistas sobre o valor do salário acrescido do valor da bolsa, ou curso pago.
"O benefício não integra o salário de contribuição, que é a base de cálculo da contribuição previdenciária. Há vários processos na Justiça, mas o Superior Tribunal de Justiça já firmou entendimento de que a bolsa de estudo concedida pelo empregador não remunera o trabalhador, pois não retribui o trabalho efetivo, de modo que não integra o salário de contribuição", diz a advogada Sarina Sasaki Manata, da assessoria jurídica da Fecomercio-SP.
"A empresa pode fazer também uma possível dedução de despesas quando fizer a apuração de lucro tributável."
Lei aprovada pelo governo federal em outubro do ano passado criou regras para tributar empresas que concedem bolsas e subsidiam a educação de seus funcionários. Até então, as empresas estavam isentas de pagar contribuição previdenciária sobre os benefícios educacionais que concediam.
Com a lei nº 12.513, empresas e funcionários passam a recolher contribuição à Previdência se o valor mensal da bolsa de estudo for superior a R$ 933 (uma vez e meia o valor mínimo do salário de contribuição, hoje de R$ 622, valor do salário mínimo) ou superior a 5% da remuneração do trabalhador. A regra diz que, entre os dois, vale o maior valor.
"Como o STJ tem jurisprudência sobre o caso [de concessão de investimentos em educação], entendo que a limitação imposta nessa lei poderá ser discutida pelas empresas no Judiciário", diz a advogada.
Para o professor José Pastore, da USP, as empresas de todos os setores são afetadas. "Sofrem impacto da lei todas as empresas que precisam e querem melhorar a qualidade de sua mão de obra."
Na opinião da advogada tributária Fabiana Gragnani Barbosa, do escritório Siqueira Castro, a nova lei tem como aspecto positivo o fato de não obrigar as empresas a ter de oferecerem o benefício a todos os funcionários.
"Na lei anterior, era obrigatório. Mas a empresa tem o direito de escolher em que níveis de cargo e em que profissionais quer investir."
Fiscalização
Para alguns especialistas, a mudança da lei pode estar relacionada ao fato de existir preocupação, por parte do governo, de que bolsas de estudo pudessem ser usadas pelas empresas como salários "ocultos", sem pagar os custos previdenciários.
"Para isso, existe a fiscalização. A Receita Federal, a Previdência Social e o Ministério do Trabalho estão bem aparelhados para autuar, multar e enviar ações para a Justiça quando encontram casos de empresas que querem camuflar o pagamento de salário como benefícios, como a PLR [participação nos lucros e resultados], por exemplo, para não pagar a contribuição previdenciária", diz o professor Pastore.
A Folha procurou a Receita Federal para obter mais informações sobre a mudança da lei e sobre atuação de empresas que não recolhem tributos da forma correta, mas não obteve os dados solicitados.
Por meio de nota da área técnica, a Previdência Social informou que "buscar o objetivo da mudança em problemas de fiscalização, não pagamento, é um equivoco".
Também infomou que as novas regras "foram pedidas no âmbito do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) com objetivo de estimular a educação profissional e tecnológica".