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voltarBase maior de retenção de INSS prejudica empresas
A norma, que aumentou para R$ 3.467,40 a base salarial tributável, exigiu que o novo teto retroaja para o mês de janeiro.
Uma lei inconstitucional que demandará um trabalho hercúleo, mas contra a qual não vale a pena protestar na Justiça. Essa é a avaliação de advogados que atuam na área previdenciária sobre a Lei 12.254, editada em junho, e que elevou o teto do salário base para a contribuição ao INSS. A norma, que aumentou para R$ 3.467,40 a base salarial tributável, exigiu que o novo teto retroaja para o mês de janeiro. Isso obriga empresas a retificarem declarações e a deduzir em salários futuros as retenções complementares relativas aos seis primeiros meses do ano.
Publicada em dezembro do ano passado, a MP 475 reajustou em 6,14% os benefícios pagos pela Previdência Social. A boa dávida aos aposentados e pensionistas custou no bolso dos trabalhadores. O salário-contribuição, sobre o qual incide a contribuição previdenciária paga pelas pessoas físicas, teve o limite máximo elevado para R$ 3.416,54. Em junho, a lei que deveria ser uma conversão da MP, novamente aumentou os patamares. Segundo a Lei 12.254/2010, o reajuste nos benefícios passou a ser de 7,72%, e o teto do salário-contribuição foi para R$ 3.467,40.
Não seria mais do que um agrado aos aposentados se não violasse alguns artigos da Constituição. Para tributaristas, a lei de conversão, que impôs nova elevação, além de não respeitar o princípio constitucional de que aumentos em alíquotas de contribuições sociais só podem vigorar a partir de 90 dias de sua edição, também retroagiu, o que a Constituição proíbe da mesma forma. A norma, publicada no dia 16 de junho, redefiniu os parâmetros para o passado, a partir de 1º de janeiro deste ano.
“Além de não ter adotado a mesma redação da MP, a lei afronta o princípio da anterioridade nonagesimal e o da irretroatividade da lei tributária”, diz a advogada Camila Catunda, do escritório Felsberg e Associados. Segundo ela, tanto a medida provisória quanto a lei só são válidas depois de 90 dias, de acordo com a previsão do artigo 195, parágrafo 6º, da Constituição Federal. A proibição de aumento de tributos para períodos pregressos está no artigo 150, inciso III, alínea a, que afirma ser “vedado à União, aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios cobrar tributos em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado”.
A mesma opinião manifestou a Federação Brasileira de Bancos, em circular enviada aos associados. “A Lei 12.254/2010 passou a vigorar apenas após a sua sanção e posterior publicação, o que ocorreu em 16 de junho de 2010, o mesmo se aplicando aos seus efeitos. Assim, a correção da base de cálculo por conta do aumento dos limites máximos dos salários de contribuição e de benefício da MP 475/2009 e da Lei 12.254/2010 não retroage a 1º de janeiro de 2010”, diz o comunicado distribuído no dia 5 de julho pelo departamento jurídico da entidade.
Embora não mexa no caixa das empresas, as mudanças causarão impacto principalmente nos departamentos fiscal, pessoal e de recursos humanos. O aumento retroativo do salário-contribuição requer a retificação de GFIPs (declaração de pagamentos em folha transmitida mensalmente à Previdência) e de retenções de Imposto de Renda na Fonte, já que a base de retenção muda com a dedução maior de pagamentos feitos à Previdência. “Haverá uma maior onerosidade tanto em questão de custos quanto de procedimentos”, diz a advogada Camila Borel Barrocas, do Martinelli Advocacia Empresarial. Para ela, mesmo que o imposto seja devido pelas pessoas físicas, possíveis autuações por diferenças de retenção virão sobre as fontes pagadoras.
Segundo a advogada, a lei pegou de surpresa até mesmo o setor de informática da Previdência. “Só em julho o software para a transmissão das GFIPs foi liberado com um campo para informar competências anteriores, dias depois da publicação da lei”, conta. A GFIP deve ser entregue pelas empresas até o dia 7 de cada mês seguinte ao da competência a que se refere.
As empresas aguardam ansiosamente uma regulamentação a ser publicada pelo fisco federal, que esclareça dúvidas óbvias. Os valores não retidos desde janeiro terão de ser deduzidos de uma só vez dos salários? Contratos de trabalho rescindidos no primeiro semestre estão fora da obrigação? De acordo com a assessoria de imprensa da Receita Federal, o órgão ainda prepara o procedimento, prometido na Portaria Interministerial 333, publicada no dia 30 de junho.
Enquanto o esclarecimento não vem, os tributaristas discutem se vale a pena começar uma briga na Justiça. Para Camila Catunda, a chance de vitória é grande. “O Supremo Tribunal Federal já disse que, para a hipótese de alteração de contribuição social, o prazo de 90 dias da anterioridade nonagesimal somente é contado a partir da edição da MP quando há a repetição dos seus dispositivos na sua lei de conversão”, diz. Quanto à retroação, segundo ela, ao julgar a incidência da CSLL em 1992, o STF decidiu que a exigência não poderia ser imediata, mas apenas depois da noventena, e confirmou a posição em 2006, em voto da ministra Ellen Gracie. “O princípio da irretroatividade, inscrito na Constituição de 1988, proíbe a imposição tributária retroativa a fim de preservar fatos geradores já realizados contra gravames legislativos supervenientes”, diz a decisão.
Já na opinião de Marcel Cordeiro, advogado do Salusse Marangoni Advogados, a ideia de entrar com um processo judicial não deve convencer as empresas. “Ela não vai ter prejuízo porque o tributo não é dela, e sim do trabalhador pessoa física”, diz. Segundo ele, apesar de toda a munição jurídica, a relação de custo/benefício não vale a pena, “a não ser em casos de empresas com muitos funcionários, cujo custo de retificação de declarações seja alto”.
A Febraban também não acredita na possibilidade dos bancos entrarem com ações. Segundo o diretor da Comissão Tributária da entidade, Carlos Pelá, caberia aos empregados entrar com ações judiciais, “com boas chances de êxito”.
No caso de empregados demitidos, Marcel Cordeiro não imagina haver complicações. “Enquanto o trabalhador estava na empresa, a retenção foi correta. Com a demissão, formou-se ato jurídico perfeito.” Para ele, o recolhimento a menor deverá ser compensado pelo próprio trabalhador quando pedir sua aposentadoria. “A lei não poderia exigir, por exemplo, que as empresas cobrassem retroativamente dos demitidos”, concorda Pelá.